domingo, 26 de setembro de 2010

Saudades

Passa da 1:00 em Portugal; onde me encontro é uma hora a mais.
Tento estudar...
Estudar?
Mas não estávamos a um estágio de acabar o curso? (ou a um estágio e uma tese, para ser mais preciso)
O que aconteceu?
26/09/2010
(!)
Quase dois anos passaram desde a última vez que se registou algo semelhante a vida neste local.
Diria que morrera de vez.
No entanto dou por mim a passear por aqui.
Em vez de estudar...
Mas estudar o quê?
Ocean Physics
?
como?
Então e os cãezinhos? E os gatinhos?
Isto é muito estranho...
Aparentemente muita coisa pode acontecer num hiato desta dimensão. Tanto, que seria improvável conseguir enumerar tudo, TUDO.
Resta uma pergunta:
Porque voltei aqui?
Sim, porquê?
Não parece fazer sentido.

A resposta está no título.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

A culpa é da crise!

Não, não morremos, não fomos raptados pelos Mujahidin, não tivemos um vírus no computador, não fomos assaltados, não caímos num poço com fundo de cimento ainda por secar, não tivemos uma paralisia nas mãos, a Ordem dos Médicos Veterinários não pôs uma providência cautelar para nos fechar o blog, não fomos denunciados pelo Bibi por escândalos sexuais, não ganhámos o Euromilhões e fugimos para a Jamaica, não fomos indiciados pelo ministério público por falcatruas no BPN, não fizemos greve ao blog, não ficámos as últimas semanas a lavar pratos no clube de strip da nossa rua após nos terem apresentado a conta, não comemos cogumelos suspeitos e não passámos este tempo todo a ver elefantes a atravessar o Tejo na Soflusa, não emigrámos para o Luxemburgo, não sofremos uma OPA hostil de um blog com maior capital financeiro, não fomos trabalhar para a pesca do bacalhau na Noruega nem fomos apanhados pelo Jigsaw e obrigados a escolher entre pôr os metacarpos numa trituradora industrial ou sermos alvo de uma falectomia com uma tesoura de podar.

Digamos que a crise económica mundial também teve as suas repercussões aqui, e provocou uma grave crise de originalidade no Betadine & Festinhas. Aliado ao facto de termos tido, nos últimos 25 dias, uma maratona de trabalhos, trabalhinhos, trabalhecos, apresentações, contagens, eu sei lá… espero que, daqui em diante, consigamos “postar” mais do que 3 textos mensais (que vergonha!).

Atenciosamente
Dr. Esticópernil



(PS: Desde quando é que numa casa de strip há pratos para lavar?…estranho…muito estranho…acho que são os cogumelos ainda a fazer efeito.)

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Será que...?

- Será que o SCP vai ser campeão?
- Será que estou a deixar crescer uma mosca?
- Será que trabalho 10 horas todos os dias?
- Será que tenho dois bordéis no quarteirão onde moro?
- Será que tenho um cartão da TMN a segurar o “4 piscas” do meu carro?
- Será que vivo onde o Afonso Henriques matou 5 reis mouros?
- Será que hoje tive folga?
- Será que o Obama vai ser o novo presidente dos EUA?
- Será que sou um craque a jogar pyramide?
- Será que o Zeinal Bava é o irmão separado à nascença do Quem-Nós-Sabemos?
- Será que gosto de comer miolos de borrego assados?
- Será que o Triple H é genro do Mr. MacMahon?

Apenas a uma destas perguntas poderão responder: “Claro que não, é mentira! (apesar de não andar muito longe da verdade)”. Descubram qual…estejam atentos aos pormenores…

domingo, 2 de novembro de 2008

"Pois...é assim...o doutor já vem!"

A cada dia que passa vejo-me confrontado com a nossa capacidade exímia de manter um diálogo sério com os clientes que aqui vêm, apenas com três frases e um movimento de cabeça. Independentemente do que possam dizer, conseguimos responder a todas as questões médicas, desabafos da vida pessoal e dúvidas existenciais com “Pois”, “É assim”ou “O Doutor já trata disso”. Por vezes acrescentamos um sorriso irónico ou um acenar de cabeça conjugado com um arregalar de olhos ou então, em alguns casos, um franzir de olhos em que produzimos ao mesmo tempo um som de chaleira em ebulição com o canto da boca contraído. Contudo, apesar de transparecermos a imagem mais tranquila e natural do mundo, o que na realidade pensamos acerca de determinada pessoa não tem nada a ver com o que falsamente aparentamos.
Exemplos:

- “Senhor doutor o meu gato anda a cuspir branco há 2 dias, o que poderá se estar a passar?”
*Resposta: “Pois”, acenando a cabeça, “É assim”.
#Pensamento: O teu gato deve-te estar a imitar. Liquefacção encefálica é causadora de hipersiália.

-“Ó Doutor, a Fifi tem 7 meses! Ela era incapaz de se meter com os outros cães amiguinhos dela e agora aparece…grávida??”
*R: Sorriso irónico e “É assim”.
#P: Deves pensar que por ter 7 meses de vida é a Madre Teresa de Calcutá, não?! Ela em 7 meses fez mais sexo do que tu em 50 anos.

- “O Sebastião apareceu com uma ferida no rabo depois de ter estado na brincadeira com outros cães machos. O que é que se terá passado?”
*R: Franzir de sobrolho e “Pois”.
#P: Esta gente não pode ver uma laceração anal e pensa logo que o cão é larilas. Parece-me recalcamento.

- “Hoje não trouxe o meu cão porque vim falar com o doutor. Preciso que me dê força para continuar o tratamento”
*R: Ar atónito e “O Doutor já trata disso”
#P: That the force be with you, wacko.

- “Se eu quiser fazer uma marinada de coelho posso juntar colorau?”
*R: Acenar de cabeça mas com olhar duvidoso.
#P: Uma massa pimentão ficaria muito melhor do que colorau.

-“O meu cão partiu a mandíbula há 3 semanas e desde então tenho-lhe dado Baytril para ver se ele se cura mas continua na mesma…”
*R: Olhar esbugalhado e paralisia momentânea.
#P: Para a próxima dá-lhe eutasil…parece que é condroprotector e estimula melhor a ossificação do que o Baytril. A senhora parece constipada…faça um cházinho com cianeto que lhe desentope as vias aéreas.

-“ Segundo o evangelho de S. Lucas, Jesus revela aos hebreus que a vida deve ser levada à imagem de Salomão, ou seja, com a menor ostentação possível pela vida material terrena, não concorda?”
*R: Silêncio prolongado e reflexão profunda. Sorriso irónico e franzir de olhos.
#P: Sim, concordo que vás ao psiquiatra e trates dessa falência cerebral.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Blogonovela - episódio 3

O ponteiro dos segundos passou-se!
Começou a girar, rapidamente, no sentido contrário ao que normalmente descreve. A velocidade era tal que me estava a pôr tonto... E então não é que, no meio de todo este frenesim, o ponteiro saiu do eixo disparado e foi embater com violência na moldura do mostrador? E desapareceu de vista! Pulverizou-se!
"Mas que diabo..."- pensei - "agora como é que vou contar os BPM's como deve ser?"
Estava eu nesta estupefacção, a olhar para o relógio como um boi a olhar para um palácio, quando me lembrei que a anestesia já estava no máximo há vários minutos.
HORROR!
Auscultei rapida e atabalhoadamente e não ouvi nada. NADA!
- Morgana, vê lá se ouves o coração!!!
Desesperado, corri para a máquina, desliguei o anestésico e coloquei o oxigénio no máximo.
-Está em paragem cardio-respiratória!!! - guinchava a Morgana.
Eu já estava encharcado em suores frios. E agora? Estávamos ali sozinhos, que podíamos nós fazer?
IPPV?
CCPR?
Rezar um Pai Nosso e uma Avé Maria?
Adrenalina intra-cardíaca?
Abaná-la e chorar histericamente?

...não foi preciso fazer nada. "Já está a bater!" - ouvi eu - "Começou agora de repente."
Óptimo! Que alívio...
Nisto, entra o "Anjo na Terra"...

...e acordei!



comentário: Sim, é verdade, como toda a gente calculava isto foi tudo um sonho, porque não há anestesista mais competente que eu, como é óbvio!

Ah, e afinal o sonho não deu uma novela, deu só uma mini-série...

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Blogonovela - episódio 2

Enquanto o Dr. Puxa-as-Patas-dos-Bichos (PPB) esgravatava as entranhas da Princesinha "ferroviária", eu contava os CCP's e os BPM's, mas como não me estava a apetecer usar o estetoscópio, apenas tinha a mão colocada sobre o esterno para poder sentir o choque pré-cordial e, dessa forma, saber que a miúda continuava viva. E nem me dei ao trabalho de olhar para o relógio e contar os segundos.
Estava-se mesmo a ver que, com tanto desleixo, a coisa ia dar asneira... E deu mesmo!
Não me apercebi a tempo que a cadela estava a superficializar da anestesia e só quando a pobrezinha acordou aos safanões e se tentou levantar da mesa de cirurgia, com as tripas todas de fora, nas mãos do Dr. PPB, é que gritei:
- Morgana, mete o anestésico em 5!!! (cinco é o nível máximo a que se pode colocar a anestesia)
Ora, com o anestésico volátil a ser bombeado a grande velocidade para o interior dos pulmões, a Princesa lá se acalmou e voltou a perder a consciência.
"Ufa! Agora já vou fazer a monitorização como deve ser", pensei eu...
Armado com o estetoscópio e com o relógio, contava alegremente os batimentos cardíacos durante 15 segundos, e repetia este procedimento de 5 em 5 minutos. Agora nada poderia falhar!
Estava nisto quando, de súbito, o ponteiro dos segundos se começou a comportar de uma forma estranha...

CONTINUA

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Blogonovela - episódio 1

Certo dia recebemos a visita da Princesa dos Comboios.
Tinha o braço partido, ou melhor, uma fractura no úmero direito. E porquê?

Atirou-se de um comboio!

A resolução era cirúrgica, através da colocação de agulhas intra-medulares, o que basicamente consiste em pegar num berbequim e enfiar umas varas de aço ponteagudas pelo osso adentro.
Chegado o dia da cirurgia, o Quem Nós Sabemos declarou que nós, os estagiários, podíamos levar a doente para a cave (cuja existência eu desconhecia até então) e fazer-lhe uma laparotomia exploratória para irmos treinando qualquer coisa até ele aparecer para fazer a osteossíntese do úmero.
É claro que ficámos entusiasmados por irmos abrir a barriga à cadela e brincar um bocadinho com o conteúdo, em nome do interesse académico, mas ao mesmo tempo estávamos assustados, pois seria a primeira vez que íamos fazer as coisas sozinhos, sem supervisão.

Mal sabíamos o que estava prestes a acontecer...

Uma vez na cave, definimos as funções que cada um iria desempenhar na cirurgia (ou devo dizer brincadeira?). Eu fiquei como anestesista, o Dr. Puxa-as-Patas-dos-Bichos ficou como cirurgião e a Dra. Morgana ficou como circulante...

CONTINUA

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Desintoxicação

Desde o início do nosso estágio que permanece inalterado um elemento que, apesar de não ter sido notado nos primeiros tempos, foi-se tornando um hábito insuportável. Não me refiro aos calafrios que sentimos na espinha sempre que esguichamos metade do conteúdo das seringas à frente do Cujo-Nome-Não-Pode-Ser-Pronunciado, antes mesmo de o injectarmos nos animais; ou na tremideira que toma de assalto as nossas mãos (qual sismo de 7,0 na escala de Richter provocado por epicentro no cirurgião mais perto de nós) quando somos pressionados por um treinador velocista a suturar os 100 metros barreiras e, no fundo, no lugar de pés, temos um par de barbatanas desengonçadas que se enrolam uma na outra mal damos três passos em chão de areias movediças. Refiro-me sim, à constante, enfadonha, detestável, infernal, odiosa RFM. Já não há paciência para ouvir as mesmas 10 músicas ao longo do dia todo. Até parece que o panorama musical (nacional e internacional) se resume àquelas 10 musiquetas de cortar pulsos e de espetar bisturis nas tripas dos mais incautos.

Meu Deus! O André Sardet que vá daqui à Lua mas que fique por lá e não volte, e no caso de ele voltar, tenho aqui uma biqueira com turbinas espaciais capaz de o lançar a Mach 5 para o sítio de onde ele veio. A Ana Free(gida) que arranje gajo em vez de passar o dia todo fechada no quarto a fazer músicas e a azucrinar a cabeça dos vizinhos e dos ouvintes das rádios portuguesas. E a Brandi Carlile, se quer cantar as histórias dela às pessoas, que vá para o Bairro da Quinta da Fonte e as cante à beira de uma fogueira rodeada pelos ciganos que lá moram. Com sorte, sairia de lá apenas com duas ou três facadas no bucho e ainda ganharia uma voz completamente diferente. Ok, de cada vez que cantasse cuspiria umas gotinhas de sangue, mas seria uma novidade total. Nunca ninguém teria escutado a voz vinda de uma pessoa com as cordas vocais estilhaçadas por uma naifa comprada na feira de Carcavelos.

Já tentámos fazer o desmame da rádio mas o grau de viciação é de tal ordem que ainda não encontrámos uma combinação de rádios suficientemente forte para enganar os doutores que lá trabalham. Tentámos o efeito sinérgico de uma MegaFM com os ritmos brasileiros e uma kizombada da Capital mas sem resultados aparentes. Continuaremos a tentar a desintoxicação, mas esta avizinha-se difícil.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Sobre a melhor bata, cai a nódoa

Uma destas tardes enquanto estava na cirurgia na condição de circulante (em que, basicamente, as minhas tarefas são as de um Ambrósio que em vez de bombons, leva pinças hemostáticas, adrenalinas, ou de vez em quando, ensopa com soro as entranhas animalescas sob ordens a 500 decibéis), compenetrado nos afazeres dos cirurgiões, gravava para a posteridade as calinadas dos meus colegas. De repente, surge de dentro do abdómen escavacado da bichana, uma estrutura desconhecida, pouco menor que uma bola de bowling, a fitar-me nos olhos. Tentei evitá-la, mas o raio da bola amarela, tapada de veias e artérias túrgidas, fazia questão em manter as hostilidades. Aproximei-me e só aí reparei o que estava à minha frente. Tarde demais! Sem mais nem menos uma bexiga mutante do tamanho de um melão e de olhar enraivecido, espreme-se e contrai-se zangada por aqueles dois panascas de bisturi na mão e sorrisos camuflados pelas máscara, a estarem a apertar. “Vá Dr. Pernil, apanhe a urina da bicha!”. Pois apanhei. 100 ml na tigela e litro e meio com a bata, roupa e sapatos. Retirei-me da sala de cirurgia encharcado e a pingar pelo chão os restos daquele geiser amoniacal sob pressão.

Aspecto positivo: a minha bata que antes estava marcada por várias nódoas, riscos, manchas e ponteados multi-colores, dando um mau aspecto aos clientes da clínica, ganhou uma cor mais homogénea mas ligeiramente amarelada. Agora os donos já têm mais dificuldade em visualizar as nódoas….contudo, acabam por ficar desconfiados quando os seus cãezinhos acham que ainda há zonas brancas na minha bata que deveriam concordar com o tom bege do restante tecido, e assim, contribuem para tal.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Resumo da semana

Esqueçam tudo o que eu disse sobre o hediondo 2º mês de estágio...
E porquê?
Porque a realidade é pior. Muito pior!
Não só o grau de exigência subiu vertiginosamente (ao ponto de dar arrepios na barriga e deixar um nó no estômago), como a comunidade animal decidiu bombardear-nos com sucessivos ataques de cães mortos-vivos e gatos kamikaze!
Senão vejamos o que aconteceu nos últimos 8 dias:

2ª-feira - Urgência ao final da manhã: Pastor Alemão com o estômago todo torcido. O que é que isto significa? Cirurgia à hora de almoço. Telepizza pós-cirúrgica.
Trabalho non-stop de manhã à noite, nem 5 minutos de cú sentado.

3ª-feira - Dra. GPL traz sandes de presunto para os estagiários!
Nem um segundo de descanso o dia todo; 10 horas sem qualquer paragem.
Sandes, nem cheirá-las!

4ª-feira - Urgência: gatinho mais para lá do que para cá... suspeita de panleucopénia felina. Estabilizámo-lo. A meio da tarde não resistiu e entrou em paragem cardio-respiratória. Foi-se! Sandes de presunto duras ao lanche.

5ª-feira - Gata muito prostrada e desidratada, a fazer soro desde manhã, entrou em paragem cárdio-respiratória. Foi-se!

6ª-feira - Dia non-stop, com direito a bêbados a entrar pelo consultório adentro...

Sábado - hora de entrada: 8:30h! Razão? Hemilaminectomia com mielografia pré-cirúrgica. Ou, trocando por miúdos, espetar uma agulha no pescoço, injectar uma papa pela medula abaixo, tirar radiografias e a seguir dar uma naifada nas costas e esgravatar os ossos até encontrar um disco intervertebral saltitão.
De tarde, Cocker vivaço partiu pela 2ª vez (!) fixador externo e agulhas intra-ósseas, no cotovelo. Agulhas retiradas do osso, estimulação excessiva do nervo vago, bradicárdia e hipotensão, cão vai-se abaixo e fica a uma unha negra de dar a alma ao criador se não fosse a nossa pronta intervenção. Safou-se!

Domingo - o dia mais curto da semana.

Hoje - Urgência de manhã: cadela Pequinês atacada por Boxer minutos depois de dar à luz, aparece com um olho pendurado e fora da órbita.
Urgência à hora de almoço: gato prostrado, hipoglicémico e hipotérmico. Foi feita a estabilização. À tarde entrou em agonia e... Foi-se! A hora de almoço também se foi... Telepizza!
Urgência à tarde: entrada de rompante de uma cadela a espumar da boca e em convulsões! Diazepam e acepromazina e lá foi ela para o país dos cogumelos, mais calminha e relaxada.

E pronto, a semana que terminou foi de doidos, mas esta que se inicia vai ser de doidos... com a medicação por fazer!

sábado, 4 de outubro de 2008

Santinhos, galinhas e vinho

Hoje foi o Dia Mundial dos Animais.
Foi também o Dia de São Francisco de Assis, o santo protector de todos os animais.
E, desta vez não há dúvidas, fontes fidedignas asseguram que foi também o Dia do Médico Veterinário em Portugal.
Mas este dia não se fica por aqui! Curiosamente, é também o Dia do Barman e o dia em que se realizava antigamente o Festival de Baco, deus romano do vinho...
Portanto, tudo encaixa e faz sentido! 4 de Outubro é o dia dos bichinhos, que precisam do seu santinho protector para não ficarem doentes, mas quando este falha estão cá os doutores para lhes valer, os quais são (ou foram, durante os 5 anos do curso) uns grandes bêbados que arrumam forte e feio na vinhaça e na sangria, os quais são vertidos nos barris pelo deus Baco e servidos nos copos pelos barmans.
Resumindo e concluindo, este dia comemora tudo o que serve para fazer os veterinários felizes: criaturas para escarafunchar e uma boa pinga para emborcar!

E como estamos numa data festiva, vou contar uma história que ouvimos da boca de alguém que tem mais uns aninhos disto que nós: a simpática Dra. X
"Certo dia aparece na clínica uma senhora, cliente habitual, acompanhada por uma vizinha sua amiga. A vizinha, com ar solene, pousa em cima da marquesa um saco de plástico que exala um cheiro nauseabundo. Segundo ela, o conteúdo do saco é... a Cassilda! Depois de aberto, o saco revela uma galinha morta e em decomposição, com larvas a sair por todos os poros.
- Sabe, doutora, a Cassilda apareceu morta de uma forma muito estranha. Fui encontrá-la no galinheiro pendurada de pernas para o ar e desconfio que o meu marido tenha abusado dela! A doutora não pode fazer um exame aí ao rabinho p'ra ver se ela não foi violada?"

Moral da história: ou os veterinários não são os únicos a abusar da pomadinha de Baco, ou as galinhas não constam da lista de S. Francisco!

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

É só p'ra dizer que voltei

Sim, voltei.
Não adianta perguntar para onde fui e o que é que fiz. Isto é um blogue sobre o quotidiano mas não é a "Maria" (é por essa razão que também não respondo às dezenas de e-mails que nos chegam com perguntas do género: "-Beijar-lhe e acariciar-lhe os seios pode causar o cancro da mama?"; "-Quando beijo a minha namorada fico cheio de borbulhas na cara. Serei alérgico às raparigas?"; "-Existem clínicas para curar os homossexuais?"; "-Fiz sexo com uma almofada e o período faltou-me no mês seguinte. Posso estar grávida?")!
O que é certo é que foram 4 dias de levantar tarde, não fazer nada durante o dia e sair à noite até me apetecer.
Um luxo!
Agora, de regresso à 5ª dimensão, dou por mim caído de pára-quedas em pleno 2º mês de estágio! O mês da besta. O mês em que a brincadeira acaba de vez. O mês em que a Dra. X nos abandona e deixa à mercê do bicho mau. O mês em que o papão vai finalmente tirar a máscara de bonzinho. O mês em que aquela efémera boa disposição e humor sarcástico vão desaparecer e dar lugar a gritos, tortura e humilhação. Possivelmente, o último mês de estágio... Provavelmente, o último mês das nossas vidas...

Desabafos cirúrgicos

Os meus companheiros de estágio teimam em continuar a castrar as fontes de líbido do cão alheio. É que não perdoam uma oportunidade! E se há homenagem que deva ser feita, é ao líbido. Tiro o meu chapéu a esse grande amigo do género masculino que lhe dá forças para se levantar todas as manhãs e passar um dia inteiro a comer e a dormitar, a petiscar ou a beber, e de vez em quando a lamber as partes fálicas (refiro-me obviamente à espécie canina). Pobres cães. Dá-me pena vê-los a acordar da anestesia e a terem como primeiro pensamento “Aaaai, tenho qu’ir à Bersh’canin comprar aquela trêla rôsa que vi láá” ou “A p*** daquela cadela Boxer anda-me sempre de rabo alçado pr’o Labradoree, e ainda por cima ‘tá gorda que nem uma balêa e tem as unhas mal arrãnjadas”. É bonito ver um Pitbull a espumar da boca com vontade de abocanhar uma qualquer pernoca de um qualquer estagiário que passe mais ao pé. Nos tempos que correm, basta uma maldita orquiectomia para transformar este brutamontes numa Lassie sedenta de festinhas e palmadinhas no rabo.

Já eu, dedico-me a artes cirúrgicas mais finas. Faz agora uma semana, apareceu lá no consultório uma cadelinha, de nome fictício ‘Ermelinda’, muito triste e desiludida com um infortúnio da vida. Em vez dos usuais pedidos para aumentar o volume dos seios ou a grossura dos lábios, a Ermelinda, nas suas próprias palavras, achava que “havia alguma coisa de errado com a sua patareca”. E havia mesmo. No lugar da “patareca”, a Ermelinda tinha um hamartoma vascular. Trocando por miúdos, tinha uma meloa de 700g e 10cm de comprimento em vez de uma banal vulva. Não quis transparecer o meu choque, mas o certo é que já tinha visto cães mais pequenos que aquele calhau. No final, tudo correu bem. A Ermelinda retirou a massa e fez uma vulvoplastia. Modéstia à parte, ficou ali um trabalho de mestre. Bonita, firme e com o tamanho apropriado para desempenhar as suas funções.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

"in Classificados - Correio da Manhã”

Jovem fogoso recém-licenciado procura para relacionamento sério mas temporário, tema de tese de mestrado descomprometida. Sem pudores ou restrições. Fundamental apresentar disponibilidade para ser submetida a várias e profundas sondagens ou investigações. Obrigatório ser possível abordar boas temáticas, bem firmes do ponto de vista científico, e ter grande flexibilidade de manipulação de dados. Preferivelmente, deve permitir a introdução de volumoso pensamento moderno, bem como, demonstrar à vontade na exposição de fotografias presenciais da actividade prática exercida.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

O líquido castanho

É verdade, já passou quase uma semana que não escrevo. O trabalho tem sido muito, o tempo diminuto, e este esbelto corpo de tão bonitas proporções, não aguenta os sofridos encargos ao qual tem sido submetido….Pronto ok, na realidade não me tem apetecido escrever! Mas o que aconteceu na quinta-feira passada fez-me voltar a escrever mais umas das minhas histórias.

Já há muito que sentia a falta dela. Já há muito que ela me fazia olhinhos de cada vez que nos cruzávamo-nos, e já há mesmo muito tempo que eu ansiava por voltar a entrar dentro dela. E entrei! Voltei à minha querida faculdade para mais uma festa do caloiro. Gostei mesmo de rever a imensidão de amigos que lá tenho e de saber as novidades da cambada toda. A noite estava a correr bem. A conversa estava boa, a bebida deslizava tranquilamente e sem pressões externas, as frases ainda eram articuladas da forma correcta, os passos eram dados sem aparente dismetria e as raparigas feias permaneciam feias. Até que, sem aviso prévio, me é oferecido numa simples garrafa do Luso um líquido de tom acastanhado. Recusei, como é óbvio, aquela bebida de origem duvidosa. Insistiram com veemência. Voltei a negar. Foi então que recorreram ao meu único ponto fraco, o meu estatuto de veterano perante um caloiro. Não tive hipótese de ripostar. Tinha que mostrar àquele menino de coro de que é feito um verdadeiro veterinário. Tinha que mostrar aos meus desafiadores que aqueles 5 anos tinha servido para alguma coisa e que aquelas manhãs enevoadas nas aulas de parasitologia, a bater com a cabeça nos microscópios, tinham um significado mais profundo do que o simples escurecimento da sala. Era preciso mostrar o porquê de ter sido aprovado com distinção na cadeira opcional de “Matraquilhologia e Copofonia Aplicada”.

Ingeri o líquido de uma assentada. O caloiro abismado caiu a meus pés e, tal como o ateu que vislumbra um milagre, ele vislumbrou em mim o modelo de vida que nunca teve, ele viu na minha pessoa a verdadeira razão de ter entrado em veterinária.
Ao invés do caloiro, eu deixei de ver. A ele e a tudo o resto que me rodeava. Os minutos seguintes foram simplesmente surreais.

#CONTINUA

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Testículos, fémures e mosaicos

Sábado foi um dia marcante! Operei pela primeira vez. Está bem, o "boss" fez metade e eu fiz a outra metade, mas não interessa. Fui cirurgião!
É neste ponto que toda a gente se pergunta que cirurgia é que eu terei feito... Pois bem, a verdade é que não me orgulho do que fiz. Quer dizer, não nego que foi uma sensação fantástica finalmente ter um bisturi nas mãos, mas quando me ponho a pensar no prazer que é olhar para os rabos das fêmeas; sentir aquele cheirinho a hormonas quando elas estão no cio; ver como elas alçam o rabo e abrem as pernas quando são agarradas por trás e sentem o peso do macho sobre o lombo; desmontar e passar a perna para o outro lado ficando colado a elas rabo com rabo; ejacular 3 vezes e permanecer dentro delas a desfrutar o momento durante mais de meia hora; fico com um grande peso na consciência por ter roubado a masculinidade a um pobre cão indefeso!
Mas pronto, acho que ele não se importou muito: ouvi dizer que agora faz comentários na "Tertúlia Cor-de-Rosa" e no "Calor da Tarde"...

Domingo é dia de descanso para todos os trabalhadores... menos para nós! Às 7 e meia da manhã já estávamos a caminho do Algarve para operar o Igor, um daqueles rasteirinhos de olhos azuis que mordem muito, agora não me lembro muito bem do nome da raça, acho que é qualquer coisa como Alligator mississippiensis, ou algo do género.
Tinha levado uma sova da irmã mais velha que lhe deixou o fémur partido em 3!
A parte engraçada foi que, para além da anestesia geral, o bicho foi atado a uma tábua com tanta corda e fita-adesiva que parecia que tinha sido atropelado, de tão espalmado que estava. Brincamos ou quê? Segurança acima de tudo! Queria ver se o rapaz acordasse da anestesia e não estivesse amarrado: toda a gente a fugir e ele a abocanhar tudo o que lhe aparecesse pela frente, enquanto arrastava os fragmentos de fémur pelo chão. Horrível!

Para finalizar, hoje aparece-nos um dogue alemão com fobia de pisar pavimentos de mosaico! Então os donos tinham que estender uma manta sobre o chão lá da clínica e ir arrastando sua excelência, o cão, em cima dela para conseguirem levá-lo da porta de entrada até à sala de consultas.
Devíamos arranjar uma sala com um divã para deitar lá estas criaturas e lhes fazer umas perguntinhas sobre a sua infância... ouvi-los contar os seus sonhos, e tal...
Psicanálise veterinária é que está a dar, meus amigos!

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Em busca do cristal perdido

Vesti a camisa e as calças de trabalho, pus o meu chapéu de cowboy, pendurei o chicote no cinto, ajustei o meu casaco de cabedal, guardei as minhas catanas da sorte, pus a Glock no coldre, comi os meus cornflakes com leitinho e parti para a aventura mais fantástica dos últimos séculos. Era uma viagem perigosa, cheia de confrontos com os monstros mais estranhos e grotescos (eritrócitos ciclopes, células de descamação carnívoras e leucócitos capazes de transformar qualquer humano em pedra após um simples vislumbre sobre um dos seus núcleos) que tentariam afastar-me do meu propósito. Após inúmeras tentativas de encontrar a pedra preciosa por parte de vários aventureiros, bastou-me um simples toque de mágico para que à minha frente o dito cristal surgisse. Sorte? Técnica apurada? Experiência de campo? Não, Olho Cirúrgico!! É tudo o que basta para que ponha a nu as fraquezas dos meus oponentes.
Apesar de tão revolucionária descoberta, esta acabou sendo desvalorizada por entidades superiores e equiparada a um qualquer vulgar calhau. Pior. Retiraram-me a descoberta das mãos, esconderam-na, e permitiram que eu ficasse sem provas para atestar a sua existência.

Malditos sejam, testemunhas visgolhas! Ficaram a rir-se de mim e não souberam apoiar-me na hora da defesa da minha teoria. Rogo-vos então, a pior maldição de todas, a praga do Zé Tolas:

“ - Zé Tolas!
O Esticópernil te chama.
Sobre meus inimigos faz-me vencer:
às meninas encolhe-lhes as mamas
e aos rapazes põe-lhes o cu a arder.

E que nas próximas semanas
a caganeira os assole,
e mesmo com UL ou bananas
não saia outra coisa que não seja mole.”

ADENDA: Por 'cristal' entenda-se 'estruvite' e por 'testemunhas visgolhas' entenda-se 'colegas de estágio'.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Pulga fresquinha

Hoje assisti a uma eutanásia.
Não foi a primeira; logo no dia de estreia tivemos um primeiro contacto com a morte...
Mas desta vez foi diferente. O Zeca já tinha ganho o meu afecto, já era um amigo. Um amigo que estava gravemente doente e que, dia após dia (esteve connosco durante 2 semanas, de forma quase diária), via a sua condição clínica piorar irreversivelmente. Irresistivelmente. Até que se transformou numa sombra de si mesmo. Não havia mais nada a fazer.
O cão era muito giro...
Mas porque é que criamos laços com os pacientes? Só torna as coisas mais difíceis!
Possivelmente no final do estágio já não me vou lembrar de ti, mas hoje senti que merecias uma homenagem, Zeca. Bom descanso!

Mudando de assunto...
Na clínica somos equipados com uma série de cassetes com frases padronizadas, que são sempre reproduzidas nas mesmas situações específicas. SEMPRE.
Quando uma dessas situações ocorre, o nosso cérebro dá um clique e, tal como se tivesse sido premido o "play", começamos a desbobinar a frase decorada.
A melhor é aquela que dizemos aos pobres bichos quando lhes estamos a enfiar uma agulha no lombo e a seguir injectamos o conteúdo da seringa, que nalguns casos dói horrores: "- olha, é só uma pulguinha... Ai que bom! Vês, é fresquinho."
Quer dizer, eu percebo que isto tenha algum efeito sobre os donos e até sirva para os sossegar um bocadinho, mas caramba! Se eu fosse um cão ou um gato ia sentir-me ofendido. Parece que estamos a gozar com eles! Damos-lhes uma ferroada e enfiamos lá p'ra dentro um líquido que parece que os está a rasgar todos e, com um tom de voz semelhante àquele que as pessoas usam para falar com as criancinhas, dizemos que aquilo é uma "pulga" e que é "fresquinho"?
Não está certo...
Ao menos que os elogiássemos! Do género:
"- És um leão!";
"- Fazes o Rex parecer um pinscher anão!";
"- Se te portares bem, soltamos-te num galinheiro durante 20 minutos!".
Ou qualquer coisa assim parecida! Os nossos pacientes iam agradecer de certeza...

No fim do dia recebemos a visita de uma colónia de pulgas infestada com um cão.
Dei por mim a agradecer o facto de elas preferirem o calor corporal dos nossos animais em vez do nosso.
Pergunto-me qual seria o destino do Mundo como nós o conhecemos e como seria o cenário pós-apocalíptico se, de repente, as pulgas passassem a preferir parasitar os humanos em vez de cães e gatos...

domingo, 14 de setembro de 2008

Operei a Madonna

Hoje vai ser o concerto da Madonna em Lisboa. Para muitos, o maior acontecimento musical em Portugal desde o lançamento do disco de José Castelo Branco!
O que ninguém sabe é que Madonna já está no nosso país desde o início da semana. E porquê? Pois bem, o motivo é uma coisa muito séria e que só me atrevo a contar aqui porque me encontro sob anonimato:

Madonna encontrou um caroço nas mamas!

Sim, é verdade. Madonna, de idade respeitável e mãe de filhos, viu-se confrontada com um possível tumor mamário nas vésperas do maior marco da sua carreira: um concerto no Parque da Bela Vista.
E o que fez ela? Ligou-se ao Google e procurou o melhor local para o tratamento de nódulos de mama... E foi assim que nos apareceu um dia lá na clínica!
Após os exames obrigatórios, foi-lhe diagnosticado o pior cenário: carcinoma mamário. Este, é um tumor maligno altamento agressivo e Madonna foi aconselhada a submeter-se a uma mastectomia bilateral (sim, eu sei o que estão a pensar: "- mas agora onde é que ela vai encaixar aqueles sutiãs bicudos?").
Neste ponto é necessário referir que todas as cirurgias lá na clínica têm a presença de 4 pessoas: o Cirurgião-mor e os três estagiários, que vão rodando nas funções de cirurgião, anestesista e circulante. Ora, quinta-feira (dia 11 de Setembro), quando Madonna deu entrada no bloco operatório, o cirurgião era eu!
Pensei para comigo: "- Com caraças, vou operar as mamas da Madonna!"
Mas nunca deixei transparecer o meu nervosismo, nem quando já estava ensopado em suor por debaixo da bata de cirurgião, e só se notou alguma tremideira quando chegou a minha vez de suturar a pele... "- O doutor está a cortar o fio muito rente, depois é mais difícil tirar os pontos. Acabou de ganhar o direito de tirar os pontos à Madonna, daqui a 8 dias."
Yupiiiii!
E pronto, a cirurgia correu bem, foram removidas as duas cadeias mamárias (4 pares de mamas), agora vai ter que ficar num local calmo e quente, não come e não bebe até amanhã de manhã, não pode fazer exercício, começa a medicação amanhã e vai ter que andar com um colar isabelino, que os gatos gostam muito de lamber a zona do penso.

Finda a 2ª semana, viagem até às origens para mudar de ares e receber uns miminhos da mamã.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Dia do Veterinário

Ontem foi o Dia do Veterinário. Pelo menos foi o que uma senhora que ouviu na rádio e veio à consulta nos disse. E eu que sou uma pessoa que acredita piamente nas pessoas, pelo menos quando estas me dão uma quantia monetária suficiente para tal, não as ponho em questão. E então, caros amigos alcoólicos, como acham que celebramos este dia? Com confettis e chapelinhos de papel? Com uma orgia zoofílica? Ou a fazer tiro ao alvo aos donos dos cães com seringas de propofol, e a contar o máximo de corpos inertes na via pública que cada um conseguia imobilizar? Não mesmo, não fizemos um cu o dia todo. De manhã pouco ou nada vimos, e a tarde, entre cortes de unhas, mudanças de pensos e o Otodectes a dormir na cadeira, passou-se rapidamente. À noite (sim, porque quando eu saio da clínica já a maioria de vocês tem o jantarinho no bandulho e estão sentados no sofá a ver a novela, ou então, estão fechados nos vossos quartos com os vossos namorados(as) – a jogar Mikado, como é óbvio), acabámos o dia na galhofa, porque até o Grande Chefe Barba Negra tem um sentido de humor apurado. Quando saí da clínica só já via bifes no lugar de cães, e frangos com bigodes no lugar de gatos. Quando a fome aperta, deixo-me invadir pelo espírito chinês e só já penso num bom Lhasa-Apso espetado num pau em cima da grelha.

Rosa-choque

Mafalda acordou mal chegaram os primeiros raios de Sol. Levantou-se. A casa ainda estava silenciosa.
Aquele ia ser um grande dia. Daqueles dias em que nada pode falhar, em que tudo está planeado ao mais ínfimo pormenor para causar a melhor das impressões. Ela tinha de ser a melhor... a mais bonita... o centro das atenções.
E qual a razão de tanto aparato?

CASAMENTO

Uma amiga da sua mãe adoptiva ia juntar os trapinhos com um tipo qualquer. Mafalda não conhecia o consorte nem sequer nutria grande afecto pela noiva... Mas isso era o menos. Aquele casamento era uma oportunidade para aparecer, para se mostrar.
E Mafalda tinha um truque na manga. Uma arma secreta para sobressair na multidão: iria pintar as unhas!
Banal? Claro que não! Iria pintar as unhas das mãos e dos pés... de rosa-choque!
Sorriu ao pensar no impacto que iria causar nessa tarde: "- Vão ficar mesmo bem, a contrastar com o branco-sujo que vou levar vestido..."
Mafalda (Maffy para as amigas) só não contou com a valente dor de barriga que surgiu quando se preparava para sair de casa. Parecia que agulhas a estavam a esventrar! A pobre ainda tentou correr para a casa-de-banho, mas não conseguiu segurar os esfíncteres a tempo e "explodiu". A sala de estar transformou-se numa piscina de diarreia sanguinolenta e o ambiente tornou-se irrespirável naquela casa.
Quando viu aquilo, a mãe adoptiva ia tendo uma solipampa.
"- Casamento estragado! Lá vamos nós de urgência para o veterinário."

E foi assim que conhecemos a Mafalda, pseudo-caniche branco-sujo, com as unhas pintadas e com fezes líquidas e sangue vivo a escorrer pelo ânus.

Aqui entre nós, cãezinhos bibelot de unhas pintadas e todos borrados, é uma coisa que tem piada.
E para ajudar à festa, esta cadela tremia mais que uma gelatina e guinchava mais que um porco na matança... Que cena impressionante! Passei a consulta toda a perguntar-me quando é que o animal iria cair ali inanimado, fulminado por tanta excitação...

Termino, dizendo que havia aqui alguém que estava a ficar demasiado famoso por dar um toque intestinal aos seus textos e eu não me podia ficar.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

A VHS perdida

Está visto que o porcalhão do blog sou eu. Não tenho culpa que, quando estou a ser espremido com 10 perguntas ao mesmo tempo e em que uma é mais parva que a outra, me dê vontade de soltar um pouco de metano para a atmosfera. Até porque, à velocidade com que se avizinha a próxima era glaciar, o meu contributo para o aquecimento global é sempre bem-vindo. Bem, mas não foi isto que me trouxe hoje aqui (apesar da porcalhice continuar).

Então não é que, nesta tão humilde casa onde habito, encontramos escondido entre cassetes do Rei Leão e do Pinóquio, uma outra VHS que tanto tem de científico, como de pedagógico: “O tratamento da candídiase vaginal”. Obviamente para não pensarem que vos estou a aldrabar aqui fica a foto para a posteridade, pois se há duas coisas que sempre defendi foram a luta contra as DST e a implementação de balneários mistos.

PS: Don´t worry Rita, já comecei a dar no UL.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Pega de caras

6 dias e 80 casos clínicos depois, sinto-me com mais 5 anos em cima, quer em idade quer em conhecimento (atenção: 5 e não 50! 50 vai ser no final do estágio...). Em idade porque, parecendo que não, isto mói uma pessoa. Tipo moinho de martelos! Para além disso, se somarmos este ritmo desumano aos sustos, stresses, suores frios, corações aos saltos tentando fugir da boca para fora e calores súbitos e ruborizantes que tivemos nesta 1ª semana, pode dizer-se que a brincadeira nos custou uns anitos de vida. Em conhecimento porque, só nesta semana, aprendi mais do que em todas as horas que passei no hospital da faculdade e já me convenci que estes 6 meses me vão dar tanta bagagem que vai parecer que fiz outro curso de 5 anos, mas de forma concentrada e intensiva.
Um dos pontos altos da semana foi um jantar com alguns ex-colegas de curso (agora futuros colegas de profissão), mas sempre amigalhaços do peito. Foi bom matar saudades e sobretudo saber que somos os únicos papalvos que já se andam a esfolar e a matar a trabalhar enquanto o resto da malta anda a gozar umas belas férias na maior das descontracções. Mas pronto, que hajam muitos destes daqui para a frente!

E agora uma dúvida existencial: O que fazer quando nos aparecem gatas viciadas em estupefacientes e que fingem ter um tumor mamário só para serem operadas e, dessa forma, serem medicadas com as drogas que tanto desejam? E que, no final da cirurgia, fingem ainda estar anestesiadas para, assim que nos apanham ligeiramente distraídos, surripiarem uma seringa cheia do "produto"e quase injectarem uma overdose que teria sido letal se não lhes valessem os nossos cuidados imediatos e um milagre do "Nosso Senhor"?
Pois é, e ainda dizem que ser "Doutor dos bichinhos" é mais fácil do que ser Sr. Dr. "médico das pessoas", não é? Enganam-se. A bicharada tem muito mais manha e ainda por cima morde com mais força.

Este fim-de-semana dei uma arrumadela no quarto e finalmente já durmo em lençóis. Está feito o desmame das férias em definitivo. Agora sim, pronto para agarrar o touro pelos cornos!

domingo, 7 de setembro de 2008

Recap

Sim, é verdade. Parece mentira mas a primeira semana esfumou-se em menos de nada. E com ela esfumaram-se as férias, as noites de borga, as cartadas ao final da tarde, o “TÁ AQUI UM BITOOOQUE” da Dona Edite, as conversas de fim de Verão sobre os lugares de veraneio, no caso das meninas, ou sobre aquela gaja muita boa que fez topless na praia, no caso dos rapazes. Enfim, foi-se o primeiro dia de aulas mas vem aí já amanhã o sétimo dia de trabalho.

Perguntam-me vocês, amigos blogueiros (desculpem o palavrão “blogueiros”, mas chamar-vos bêbados publicamente podia ferir susceptibilidades), como correu a primeira semana e se me borrei quando fiz a primeira asneira? Correu bem, dentro dos possíveis, e sim borrei-me mas ninguém reparou. A semana até teve vários aspectos positivos:

* Não matamos nenhum animal acidentalmente, apenas propositadamente. Ainda houve lá uns que bem se esforçaram com umas convulsões e umas apneias e tal, mas o boss abriu-lhes os olhos e eles recuaram na intenta.

*Suturamos umas coisitas, 2 batas e 4 pares de peúgas. Ahh e também uns bichitos. É curioso, mas de cada vez que suturamos algo, surge uma voz do além que tenta acelerar o processo mas ainda não descobrimos de que lado vem.

*O meu parceiro de estágio armou-se em dealer e tentou converter um dos animais ao vício das drogas, mas o raio do gato armou-se em menino e não quis mais.

A segunda semana começa amanhã e já vimos mais de 80 pacientes, xiça que aquilo não pára. Espero que esta semana as minhas pernas não se queixem tanto e que descubram que o português vencedor do Euromilhões tenha sido eu!

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

A 5ª dimensão

Muita gente não sabe, mas no que toca a dimensões, já não estamos limitados à 3D clássica. Existe a 4ª dimensão, que está presente, por exemplo, quando realizamos uma ecografia a 3 dimensões em tempo real. O facto de ser em tempo real acrescenta a 4D à tridimensionalidade da imagem.
Posto isto, estou em condições de anunciar que ao 3º dia de estágio descobri a 5ª dimensão!
E em que consiste a 5D? Como se manifesta?
Pois bem, na 5ª dimensão todas as superfícies estão resplandecentemente lavadas e desinfectadas e todos os instrumentos e respectivas reentrâncias meticulosamente limpos.
Na 5ª dimensão tudo gravita irresistivelmente para o lugar a que pertence, sendo que a simetria que rege a disposição de todos os objectos é mais do que perfeita.
Na 5ª dimensão, sempre que a harmonia é quebrada pela entrada de um cliente, o sistema reage em busca de um novo estado de equilíbrio em que cada um tem uma posição bem definida no consultório, sendo obrigatório ali permanecer para evitar o caos.
Na 5ª dimensão, quando um cliente entra na sala de consultas, todos papagueamos "bom dia" ou "boa tarde" e estendemos a mão, sem excepções. Quando um cliente se retira da sala, todos papagueamos "bom dia" ou "boa tarde" e acenamos, sem excepções.
Na 5ª dimensão, nenhuma porta é esquecida aberta ou algo horrendo pode acontecer...
A 5ª dimensão apenas se dissipa quando saímos da clínica, já de noite, mas só se sair toda a gente ao mesmo tempo!
É por isto que às vezes me sinto um autómato.
E é por isto que me tem dado tanto gozo manter o quarto por arrumar, ainda com sacos e caixotes cheios de tralha espalhados pelo chão.

E o saco-cama ainda está no mesmo sítio!

O calvário do anestesista

É horrível! É simplesmente horrível quando nas nossas mãos recai a vida de um paciente. A nossa única e "simples" missão consiste em zelar pela constância de BPMs e CCPs, e mais BPMs e CCPs, e ainda mais um ou outro BPM ou CCP foragido. Isto chega ao ponto de pedirmos aos anjos e santinhos, e a mais alguém que nos ouça, para que faça com que aquele corpo desmaiado e imóvel, continue a soltar pequenos sinais sonoros através das suas entranhas. Já tinha apanhado muitos sustos, mas nada se compara à ausência momentânea de um batimento cardíaco ou de uma aparente apneia aquando do acompanhamento da anestesia do paciente. "Uffa, tou safo, quase que me mijava pelas pernas abaixo. Espero que ninguém note no cheiro dos peidinhos que dei", é a única coisa que penso quando acaba finalmente o raio da cirurgia. O pior de tudo é que em quatro dias já "fiz" tantas cirurgias como quantas "fiz" em 5 anos de faculdade. Se um dia destes me perguntarem se prefiro um milhão de contos ou que todas as cirurgias que faça corram sem percalços...Obviamente escolherei o milhão de contos e passarei o resto da minha vida a gozar, através de vídeo-conferência a partir das Maldivas, com os anestesistas que trabalhem no meu monopólio de clínicas.

PS: Um obrigado especial a uma atenta espectadora do nosso, ainda prematuro, blog que nos tem comentado os posts. Contudo, espero que no futuro haja mais pessoas, porque isto de estar sempre a ser corrigido por essa espectadora (que segreda aos pedaços) já começa a chatear.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Desvarios

Penso que a palavra correcta para descrever o primeiro dia seria "Sobrevivi"! Não que haja alguém com o apelido de Vivi e sobre a qual eu não me importaria de permanecer, mas sim porque o mundo naquele sítio é controlado a régua e a esquadro. A partir do momento em que até um simples coçar da zona escrotal tem que ser paralelamente executado à rafe sagital no sentido caudo-cranial, pois assim o chefão o faz há mais de dez anos e nunca teve qualquer caso de coceira crónica, pode-vos dar a noção de que, dentro daquelas quatro paredes, tudo está comprovado cientificamente e nada escapa aos desígnios do Rei Migas.

Sinto-me outro. Sinto-me diferente. Sinto a minha virgindade estudantil finalmente desflorada pela prática médica real. Ao contrário das minhas pernas em que não sinto absolutamente nada dos joelhos para baixo. Bem que este estágio podia ter um seguro médico para prevenir o, mais que provável, aparecimento de varizes. E se não for preciso para as varizes que o seja para financiar um substituto do álcool que necessito para a minha desintoxicação. Pois se uns ganham metadona à pala, porque é que não posso receber um Herdade do Esporão 2006?

PS: Engraçado a facilidade com que se descamba de um discurso mais ou menos coerente para os desvarios alcoólicos de um ex-estudante.

Doença instalada

1º dia!
Tanto para dizer e no entanto o bloqueio mental é tal que nada me ocorre...
#BRANCA#
O corpo também está a dar de si; o meu camarada deitou-se no sofá e já dali não sai se eu não o acordar!
Qual a entidade clínica mais provável para este quadro sintomatológico?

Diagnóstico diferencial:
1- Sonite Aguda - dormimos apenas 3 horas ontem à noite, véspera da nossa estreia no mundo do trabalho real e duro;
2- Sindrome de Sobrecarga Laboral - passámos cerca de 11 horas de pé (9, se descontarmos a hora de almoço), o que pode ser bastante puxado para quem não está calejado. Para além disso, passámos os últimos 3 meses ora sentados ora deitados, e o único exercício físico que fizemos nesse período consistiu em levar um garfo ou um copo à boca;
3- Necrose Geracional - já não se fazem jovens como antigamente, parecemos uns velhos enferrujados, estoirados logo ao final do 1º dia;
4- Deficiência grave em Vitamina F(érias) - acabaram abruptamente e antes de tempo e o nosso organismo está a manifestar sinais de carência;
5- Insuficiência Multissistémica Total, também designada por Salve-se Quem Puder - mistura de todos os processos anteriores.

Na realidade o dia foi bastante positivo. Aprendemos imenso, divertimo-nos à brava e ainda conseguimos deixar uma boa impressão junto dos pacientes! E digo isto porque chegaram aos nossos ouvidos rumores de que os nossos nomes são já excelentemente referenciados nos círculos caninos e felinos (e psitacídeos também!)...

Saco-cama - episódio 2, aqui vou eu!

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Um parto e um saco-cama

Ora viva!
Estou muito emocionado por estar a escrever esta mensagem, depois de um parto demorado como foi o deste blogue. Sinto-me um pai babado e, se não fosse a ligeira dor de cabeça e o peso nas pálpebras que sinto neste momento, ficaria aqui a escrever linhas e linhas de elogios acerca da criança... Mas depois amanhã não ia trabalhar. E como a legislação ainda não prevê a atribuição de licença de parto aos criadores de blogues, vou ver se durmo qualquer coisita...
Mas não me vou sem antes referir que estamos há aproximadamente 4 horas nisto, 2 das quais foram gastas a escolher um nome para o blogue!
Tenho o quarto semeado de caixotes ainda cheios e um colchão que me faria corar na presença do vizinho de baixo, se não morasse no rés-do-chão, mas enfim...
Hoje durmo no saco-cama.

Pródromo

Após 5 anos a demolhar os neurónios em jantares e festas bem regadas, vulgo estudar, resolvemos pôr em prática um plano antigo. Não nos referimos àquele em que tentamos cruzar espécies diferentes, pois mais tarde descobrimos que a Ciciolina já o tinha conseguido com um macho equideo, mas sim o de escrever no blog as aventuras de dois rapazes extremamente atraentes acabados de sair de um antro de alcoólicos, vulgo faculdade, na vida real. E o que se entende por vida real? Não me refiro a nenhum reality show nem tão pouco a um programa do Artur Albarran, mas sim ao estágio numa conceituada clínica veterinária.